30 anos de Street Fighter, parte 4 – Crossovers e dificuldades

Depois de passar pelo começo da série, a explosão de Street Fighter II e os altos e baixos durante a segunda metade dos anos 90, hoje vamos falar dos últimos grandes jogos de luta que envolveram duas séries de crossovers e o hiato que Street Fighter viveu em parte dos anos 2000.

It’s Mahvel baby!

No já distante ano de 1996 foi lançado um crossover que mudaria muita coisa no mercado de jogos, X-Men vs Street Fighter. O título fez um sucesso estrondoso ao juntar os mutantes da Marvel, que faziam bastante sucesso na época, contra Ryu e companhia. A mecânica de batalha em duplas, com trocas a todo momento e golpes conjuntos fazia o olho de qualquer jogador brilhar.

No ano seguinte, a ideia foi expandida com Marvel Super Heroes vs. Street Fighter. O game trazia novos personagens mas sem grandes inovações gráficas ou de mecânicas. O próximo passo, já em 1998, mais uma sequência Marvel vs. Capcom: Clash of Super Heroes, que de fato trouxe novidades. Além de nova interface e cenários, o game introduziu o sistema de Special Partners, 20 personagens (fora os secretos) não jogáveis que podiam ser usados no meio da luta para uma interversão especial. Com Street Fighter III não sendo o sucesso de popularidade na época – e The King of Fighters ganhando espaço cada vez mais -, a série “VS” acabou se tornando o grande produto para a desenvolvedora japonesa.

Só que o melhor de todos veio em 2000 com Marvel vs. Capcom 2: New Age of Heroes. Largando de mão CPS-2 e usando a placa Naomi, da Sega, o novo game trazia cenários com efeitos 3D. As lutas agora eram em trio, não mais em duplas deixando as disputas ainda mais frenéticas. E claro que não posso deixar de citar o cast de 56 lutadores presentes do game, sendo que quase metade era secreta, devendo ser desbloqueada por pontos que o jogador acumulava ao jogar.

Vs. SNK

Tanto Capcom como SNK se especializaram em jogos de luta ao longo dos anos, se tornando referências no assunto. Imaginar todos aqueles personagens se batendo no mesmo game foi um dos sonhos de muita gente. Sonho esse que virou real quando as duas empresas anunciaram uma parceria em 1998.

Descartando jogos de carta feitos pela SNK, cada empresa iria lançar dois jogos cada. E devo dizer que o primeiro foi meio “esquisito”. Simplesmente porque SNK vs. Capcom: The Match of the Millennium (1999) foi lançado para um console que ninguém tinha, o Neo Geo Pocket. Felizmente hoje em dia o título está bem mais acessível, estando disponível para Switch e Steam.

O primeiro jogo para plataformas de mesa saiu em 2000, Capcom vs. SNK: Millennium Fight. Em 2001 Capcom vs. SNK 2: Mark of the Millennium foi lançado e se tornou a versão definitiva do confronto, com 48 personagens das diversas franquias das duas empresas, seis sistemas de luta diferentes e tudo que um encontro entre dois titãs mereceria. Gosto de pensar que esse jogo foi o  “canto do cisne” dessa primeira era dos jogos de luta. E já explico essa citação.

Nesse meio tempo a SNK passou por graves problemas financeiros, chegando a declarar falência e depois sendo comprada pela Playmore, passando por fortes reestruturações. Isso acabou refletindo na qualidade de SVC Chaos: SNK vs. Capcom, lançado em 2003 e, pelo que dizem, só feito para cumprir o contrato com a Capcom.

Anos sabáticos

Sabe porque me referi a Capcom Vs SNK 2 como o canto do cisne dos jogos de luta? Pois bem, a virada do milênio também marcou uma nova fase o gênero. O título foi basicamente o último dos grandes do gênero. O último Street Fighter novo lançado foi Street Fighter EX 3 em 2000. Não há um motivo específico para isso mas podemos citar alguns fatores empurraram não só a franquia da Capcom como o gênero como um todo para as margens do mercado:

  • A internet começava a se popularizar, possibilitando que as pessoas jogassem on-line coisas novas. Jogos de tiro e de estratégia lideraram esse movimento.
  • Reflexo do item acima, casas de arcade tradicionais pontos de encontro para fãs de jogos de luta começavam a sumir do mapa. Talvez só no Japão elas tenham sobrevivido em grande número. Aqui no Brasil, assim como em outros lugares, a febre da época eram as lan houses, que cresciam em popularidade e se mostravam mais rentáveis.
  • O salto de tecnologia do PlayStation para PlayStation 2 abriu um leque de possibilidades novas para as desenvolvedoras. Jogos de luta 2D já não pareciam ter tanto apelo com o público e eram poucos os 3D que alcançavam um nível satisfatório de qualidade.
  • Querendo ou não, o mercado estava saturado de tanto jogo de luta lançado em tão pouco tempo. De 1991 a 2000 foram lançados pelo menos um Street Fighter por ano, as vezes dois ou três. Multiplique isso levando em conta as outras franquias grandes e médias nesse meio tempo.

Isso não significa a primeira metade da década dos anos 2000 tenha sido um período sem títulos com relevância. Tekken e Soul Calibur foram umas das poucas séries que se mantiveram firmes nesse tempo. Mortal Kombat esteve sempre ali, com seus altos e baixos. A Arc System Works começou a aparecer no mapa com Guilty Gear, mas que ainda era algo bem de nicho. Quanto a Street Fighter a série passou vivendo de relançamentos e coletâneas. Muitos achavam que a época das lutas virtuais havia acabado, ficando relegada a pequenos grupos.

Uma das série de video-games mais popular dos anos 90 estaria fadada a ser somente uma lembrança de tempos passados? Teria sido só um “modinha” que fez com que Street Fighter de um sucesso absoluto tenha virado “qualquer coisa”? Hoje sabemos que vários gêneros acabam indo e voltando, mas a 20 anos atrás não era difícil ler em algum site ou revista que jogos de luta já não tinha espaço no grande público. Com tantos títulos de ação e aventura, games de tiro crescendo rapidamente, quem se importaria em voltar as lutas bidimensionais?

Felizmente essa história não termina aqui, graças a Yoshinori Ono, funcionário da Capcom que ingressou na empresa em 1998 como diretor de som de Street Fighter Alpha 3. Entre 2004 a 2006 foi produtor de três jogos: Capcom Fighting Jam, Shadow of Rome e Onimusha: Dawn of Dreams. Neste último, acabou fazendo uma pequena brincadeira que seria vital para seu projeto futuro. Haviam quatro trajes secretos no game, as roupas de Ryu, Ken, Guile e Chun-li (Ono sempre foi um grande fã de jogos de luta). Quando o produtor notou que esse segredo teve uma ótima repercussão com o público, percebeu que Street Fighter ainda era uma série muito querida e que talvez fosse hora de resgatá-la das cinzas.

Ono começou então a sua jornada em convencer as pessoas da Capcom a fazer um novo game — ideia essa que ninguém mais lá dentro cogitava. Além de jogos de luta já não terem o mesmo apelo de mercado, a marca “Street Fighter” ainda tinha seu legado sagrado. Uma nova entrada na série poderia ser um desastre de várias maneiras. As coisas começaram a mudar com o lançamento de Street Fighter II’: Hyper Fighting na Xbox Live, o qual teve uma recepção muito boa por parte do público. Esse foi o argumento que Yoshinori Ono precisava para ter o aval do Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento, na época liderado por Keiji Inafune e dar inicio ao desenvolvimento de Street Fighter IV.

 



Bruce

Jornalista, Game Designer e perito na arte das piadas de qualidade questionável. Adora sofrer em soulslike, perder horas em jRPGs e passar a vida no Final Fantasy XIV