Análise: Alice: Madness Returns

Toda pessoa é, de modo geral o resultado de suas memórias e experiências que vivenciou ao longo da vida. Ainda que muitas coisas sejam difíceis de suportar e até mesmo de compreender, temos que carregar toda nossa história, os momentos bons e ruins e lidar com ela da melhor forma possível. Esse tema, que renderia uma ótima discussão, é um dos pontos principais da trama de Alice: Madnesss Returns, jogo de 2011 desenvolvido pela Spicy Horse e publicado pela EA.

Recentemente terminei o jogo pela primeira vez lá no meu canal da Twitch, e aproveitando que o conteúdo está fresco na memória, resolvi que seria legal fazer essa análise. Muita gente não conhecia o jogo e ele é um game que ainda merece muita atenção. Vamos começar pelo começo e, para isso, vou voltar para 2000, em American McGee’s Alice – primeiro jogo da série e falar um pouco sobre ele – com spoilers, mas é preciso.

O Retorno da Loucura

Em American McGee’s Alice, a garota, então com 8 anos, acorda de seu sonho no País das Maravilhas com um incêndio. Sua casa está pegando fogo e, fugindo pela janela, ela é a única sobrevivente – seus pais e sua irmã mais velha morreram no incidente. Acreditando ser a culpada de tudo, mesmo sem entender o que de fato aconteceu, Alice é internada no Asilo Rutledge, passando quase 10 anos em um estado catatônico. Seu corpo se recuperou das feridas, mas sua mente estava destroçada.

É durante esse período que se passam os eventos do primeiro game. Alice, atendendo a um pedido do Coelho Branco, parte em jornada para arrumar o caos que se tornou o País das Maravilhas, derrotar a Rainha de Copas e recobrar sua própria sanidade. No final, Alice consegue reestabelecer o País das Maravilhas e sua própria mente. Assim ela tem alta e deixa o Rutledge.

Um ano depois começa a história de Madness Returns. Alice, agora com 19, mora em um abrigo para menores comandando pelo psicólogo Dr. Angus Bumby. Embora melhor psicologicamente, a garota ainda carrega o peso do dia do acidente, acreditando ser culpada e, por isso, passa por sessões de tratamento com Bumby para tentar solucionar essa questão. O médico acredita que a melhor forma de lidar com o problema é eliminando as memórias ruins e  deliberadamente faz com que Alice volte para o País das Maravilhas através de hipnose. E assim uma nova jornada se inicia.

Em uma Wonderland ainda mais caótica do que da primeira vez, um misterioso trem corre todas as terras e espalha o caos pode onde passa. Alice então percebe que aquele mundo está ruindo e isso significa que sua própria mente está em perigo. Assim, explorando diversos lugares do País das Maravilhas, Alice tenta resolver esse quebra-cabeça que está disseminando o caos ao mesmo tempo que se afunda nas suas memórias para tentar se lembrar o que de fato aconteceu no dia do incêndio – e não perder sua sanidade no processo.

Alice: Madness Returns usa muito bem as referências do material original, os livros de Lewis Carroll “Alice no País das Maravilhas” e “Alice do Outro Lado do Espelho” e vai além, continuando com sua temática mais obscura e pesada iniciada no jogo de 2000 e muito bem continuada aqui nessa sequência. O texto do jogo é caprichado e há muito a ser pego nos detalhes e nas entrelinhas.

Em temos de mecânicas, Madness Returns é simples e competente, com alguns pequeninos escorregões. Sua principal arma é a Vorpal Blade, mas além dela há o Peper Grinder (uma “metralhadora”), Hobby Horse (uma “marreta”) e o Teapot Cannon (um canhão haha). O kit não é grande mas, por outro lado, todas as armas se mostram úteis nos diversos confrontos além de que, exceto pela faca, todas as outras são usadas nos puzzles do game para liberar caminhos e desbloquear segredos.

Aliás segredos não faltam no jogo. Há muitas passagem secretas e itens colecionáveis que trazem pequenas pílulas do background de Alice, com falas de outros personagens sobre ela mesma. Isso vai ajudando a montar o cenário no qual a garota viveu até então, em um mundo que não foi muito gentil com ela, vamos por assim dizer.

Ao meu ver o maior problema é na câmera quando o alvo está travado em algum inimigo. É comum ela se perder e se for um combate contra um grupo grande, a situação pode ficar meio chatinha. Mesmo sendo um jogo de 2011, podemos pensar em exemplos que resolveram melhor essa questão.

Já na parte técnica o game se sai muito bem. Os gráficos são muito bonitos e variados. Cada capítulo se passa em um cenário completamente diferente, trazendo um ótimo trabalho de direção de arte – de mundos belos e coloridos até lugares grotescos e perturbadores, tem de tudo. O design dos cenários também é digno de elogios. Alguns puzzles se repetem aqui e ali, mas é coisa pouca, isso está longe de ser um problema. Por fim destaque positivo para a trilha sonora que faz muito bem de ampliar a imersão dentro dos diferentes mundos e das situações de jogo.

Fechando toda essa ideia, Alice: Madness Returns é um ótimo jogo e mesmo 10 anos após seu lançamento, se mantém interessante por sua narrativa e por suas qualidades técnicas e artísticas. A forma como ele traz a “loucura” de Alice, como ela lida com seus traumas e as ameaças – internas e externas – e sua relação com os elementos do País das Maravilhas é muito interessante e vale com certeza um olhar mais atento, abrindo espaço para muitas discussões. Atualmente o jogo está disponível para PC somente na Origin, PS3 e Xbox 360 – compatível com a retrocompatibildidade no Xbox One.

Cópia digital do jogo comprada pelo redator.



Bruce

Jornalista, Game Designer e perito na arte das piadas de qualidade questionável. Adora sofrer em soulslike, perder horas em jRPGs e passar a vida no Final Fantasy XIV