Hellblade: Senua’s Sacrifice – entre sombras e a luz

Há certas missões nas quais um herói se dispõe a abrir mão de tudo em troca de um bem maior e assim cumprir sua meta. As vezes, porém, não é questão de abrir mão do que se tem, mas não ter absolutamente mais nada a perder. Seu objetivo se torna a única fagulha que o separa do fim, que pode ser simbolizado não somente pela morte, mas pelo desespero e a loucura. É neste segundo cenário, muito mais aflitivo e desesperador, que está Hellblade: Senua’s Sacrifice.

Somos apresentados à jornada de Senua, uma guerreira celta em busca de uma forma de salvação para a alma de seu amado Dillion, morto em homenagem à deusa nórdica Hela pelos vikings, quando estes invadiram seu povoado. Uma narrativa trágica, sem dúvida, mas que possui contornos ainda mais densos quando nos aprofundamos em seus pormenores.

Hellblade

Desde seu lançamento, em 2017, Hellblade figurou na minha lista de “coisas que eu ainda quero jogar”. Finalmente consegui neste começo de 2020 e digo, sem a menor sombra de dúvidas, que foi uma das experiência mais fortes que já tive jogando um game. Como poucas vezes, eu me senti esgotado após uma sessão do game. Hellblade evoca sentimentos e conflitos da mente assustadores, presentes no nosso mundo real e as vezes muito próximas da nossa vida.

A protagonista da história é retratada como alguém que sofre de psicose, uma doença na qual a pessoa se descola da realidade com ilusões e delírios. Sua condição nunca foi tratada de forma adequada, visto que seu pai a trancava em casa por acreditar que tal mal era uma maldição dos deuses. Essa falta de perspectiva, as perdas das pessoas as quais Senua estimava de forma trágica e uma vida inteira de tormentos a quebraram de maneira aparentemente irreversível, conforme encontramos Senua no começo do jogo. O que a move é a chance de salvar a única pessoa que acreditou nela, Dillion.

Hellblade

Embora o tema maior da trama seja a forma como a psicose afeta Senua, outros distúrbios mentais também são retratados ao longo da caminhada: depressão, ansiedade, auto-estima, etc. E é nesse ponto que a Ninja Theory se destaca ao conseguir, de maneira muito satisfatória, falar e mostrar esses problemas sem parecer algo superficial ao mesmo tempo que pegou essas características e construiu mecânicas de jogo em torno delas com muito sucesso.

Cada passagem do game foca em algum desses aspectos e ter um desses sentimentos “materializado” gera um misto de sensações: de alívio por saber que mais pessoas entendem aquilo e tensão por entender o que aquilo significa. Se achar fraco para seguir em frente ou em uma sala escura cheia de criaturas foram alguns dos momentos que bateram bem próximo, me fazendo refletir sobre momentos da minha vida.

Mas Hellblade não é só tragédia. Nos momentos mais duros, quando tudo parece já estar perdido ele nos mostra que é possível superar nossos medos e demônios. Que ter a ajuda de pessoas próximas e que acreditam na gente é fundamental para sair do caminho das sombras. Que por mais que a gente perca, sempre há uma nova história para seguir em frente.



Bruce

Jornalista, Game Designer e perito na arte das piadas de qualidade questionável. Adora sofrer em soulslike, perder horas em jRPGs e passar a vida no Final Fantasy XIV

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